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Educação e cultura: a importância da intersecção entre elas

Conteúdo do Artigo

Aproximar as áreas da Educação e da Cultura é fundamental. Acredito que essa afirmação é uma unanimidade (ou quase) entre educadores, estudantes, trabalhadores da área e, inclusive, entre as pessoas em geral. Mas o que devemos nos perguntar é: de qual Educação estamos falando? Como entendemos a Cultura?

Ambos os conceitos são amplos e muito difíceis de serem vistos apenas sob uma única ótica, uma única lente, um único olhar. Eles já foram estudados por diversos autores, das mais diferentes áreas do conhecimento. Assim, pontuar como compreendemos esses conceitos é fundamental para chegarmos a algumas conclusões.

Gostaria de ressaltar que, para escrever este texto, tomei como base minha trajetória no Mestrado em Educação, realizado na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em 2016, no qual fui orientada pela Dra. Marineide de Oliveira Gomes. Juntas, pesquisamos a formação cultural de professores em museus de arte da cidade de São Paulo

Mas, então, como compreendemos o conceito de Educação? De qual Cultura estamos falando? Por que é tão importante a intersecção entre essas duas áreas? É o que abordarei a seguir.

Educação e Cultura: definindo conceitos

Se você atua ou estuda na área da Educação, sabe que esse conceito não é tão simples de ser definido. Ao tratar dele, uma série de palavras vêm à tona, variando de acordo com a nossa experiência frente ao conceito: educação formal, educação não-formal, educação moral, educação profissional, educação básica, educação ao longo da vida, educação escolar, educação não escolar, entre outros. Junto com ele, outra série de palavras podem estar associadas: escola, professores, políticas educacionais, conhecimento, aprender, ensinar…

Portanto, ressalto as escolhas conceituais deste texto (e do trabalho de pesquisa já citado anteriormente): educação é um ato político!

Para essa definição, tomamos como base os pressupostos de Paulo Freire. Nascido em Recife, Pernambuco, no ano de 1921, Freire é o Patrono da educação brasileira. Dedicou sua vida na busca de uma educação democrática, e seu grande sonho era a transformação da sociedade, para ser menos autoritária, discriminatória e desigual. 

Freire acreditava na pluralidade do conceito de educação, resumindo, basicamente, em dois tipos: educação bancária, que serve aos interesses do capital e que torna as pessoas “menos humanas”, pois aliena, domina e oprime; e educação libertadora, que transforma, tornando os seres mais livres e mais humanos.

Nesse sentido, decidir qual Educação você defende, acredita e atua é sempre um ato político. Não há neutralidade nas ações. Gosto muito de usar o seguinte exemplo: se você é educador, presencia um ato de racismo na sua sala e não realiza nenhum tipo de intervenção no assunto, tentando se manter neutro, você está compactuando com a propagação da situação (que, digamos de passagem, é um crime).

Compreendo, portanto, a Educação como ato político e a defendo aqui como prática de liberdade, que transforma, que liberta. Seja ela formal, não formal, com crianças, adolescentes ou adultos. Educar para transformar é uma premissa básica para continuarmos a discussão deste texto.

Mas, neste cenário, onde entra o conceito de Cultura? Assim como a Educação, definir Cultura é um trabalho árduo. E assim o foi para mim, no meu processo de pesquisa, uma vez que não é a minha área de formação. Esse é um conceito ambíguo e entendê-lo se faz fundamental.

Dentre as mais diferentes linhas de estudiosos sobre a Cultura, há aqueles que limitam esse conceito, entendendo Cultura como Artes e fazendo críticas à indústria cultural, como é o caso dos estudiosos da Escola de Frankfurt. No caso, indústria cultural pode ser definida como um conjunto de meios de comunicação (cinema, rádio e a televisão) que formam um sistema poderoso com intuito de gerar lucros e, por serem mais acessíveis às massas, exercem um controle social.

Contudo, aqui, o intuito não é limitar o conceito de Cultura apenas a determinadas áreas do conhecimento. Foi com muito respeito à linha teórica da Escola de Frankfurt que descartei essa hipótese, pois, restringir Cultura às Artes, em um país tão desigual como o nosso, poderia denotar certo grau de elitismo, afinal, quem tem acesso às manifestações artísticas no Brasil?

A partir desse questionamento, o conceito de Cultura toma outro rumo: o antropológico, que compreende a Cultura como produção de todo ser humano e que é fruto da construção da sociedade. Nesse sentido, compreende-se a Cultura de uma forma ampla, considerando todas as manifestações e expressões culturais de uma sociedade, indo além dos produtos fabricados pela indústria cultural.

Ressalto que não me refiro a uma visão dicotômica que polariza a cultura erudita, em que as elites detêm o conhecimento, e o povo, a cultura popular. Mas sim à cultura de maneira geral, sem excluir gênero, etnia, credo ou expressão cultural. 

Portanto, compreendendo Educação como ato libertador/transformador/político, e Cultura em sua forma ampla, considerando todas as manifestações e expressões, qual é o elo entre as áreas? E por que é tão importante essa intersecção?

Educação e Cultura: intersecção para emancipação e transformação

A união entre as áreas se faz fundamental com base nos conceitos já abordados anteriormente por algumas questões. Ainda, ressalto a importância de proporcionar vivências culturais amplas para as crianças. Como já apontado aqui, vivemos em um país desigual em oportunidades e, muitas vezes, as famílias não têm acesso amplo às vivências culturais. 

Contudo, a Cultura (assim como a Educação) é um direito de todos. Assim, cabe à escola se tornar um espaço que proporciona esses caminhos, um espaço cultural. 

Ressalto também que essa intersecção pode contribuir para a melhoria da qualidade da educação. Isso porque vivenciar as manifestações culturais é ampliar os conhecimentos dos estudantes, é expandir os horizontes, é contribuir para a mudança em sua visão de ver/ser no mundo. A realidade é muito contraditória e difícil, mas buscar formas de transformar é uma função da educação emancipadora.

Em suma, Educação e Cultura são transformadoras e, juntas, suas funções se potencializam. Portanto, compreender o potencial educacional da cultura e encarar a escola como um caminho de democratização cultural é pensar na mudança das realidades sociais. 

É um caminho de luta e de muitas dificuldades, uma vez que a desvalorização de ambas as áreas é de conhecimento geral. Porém, esse caminho pode acontecer de algumas formas, sendo duas delas: com políticas públicas e com a formação cultural de professores. Mas isso já é assunto para outro texto…

Tipo de conteúdo
#livros Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa, de Paulo Freire.

Ação cultural para liberdade e outros escritos, de Paulo Freire.

Cultura: um conceito antropológico, de Roque de Barros Laraia.

Dicionário Paulo Freire, de Danilo R. Streck, Euclides Redin e Jaime José Zitkoski (Orgs.).
#dissertaçãoFormação Cultural de Professores: perspectivas a partir da análise de ações educativas em Museus da cidade de São Paulo, de Jessica Sacuman (Dissertação de Mestrado).

 
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